quinta-feira, 28 de maio de 2009

O HOMEM QUE COMIA FOTOS – PARTE 9: O TIRO


“Morto???” – gritou Negão. “Como assim morto?!” – completou. “Morto Negão, o que é um morto seu idiota??” – respondeu a cafetina, jogada no chão. “Eu saí do banho, fui ver como ele estava, e ele estava morto!” – gritava e chorava Joana. “Caralho Joana, e agora?” – perguntou nervoso, o amigo. “Some com ele daqui, me deixa sozinha, não aguento mais Negão, eu não aguento mais! Some com ele, tu fez tudo errado seu merda, a culpa é tua! Não faz nada direito!” – dizia Joana aos prantos. Negão enrolou o corpo de Carlos num lençol e saiu.
“Eu não posso dançar com você!” – disse Zé, enquanto acalmava o choro. “Eu não posso ouvir música!” – continuava. “Podemos dançar sem música se você quiser?” – respondeu Sandra. “O que aconteceu com você menina? Há pouco queria sair daqui, estava chorando, e agora queres dançar comigo? Por que?” – perguntava o homem, enquanto levantava do chão. “Não faz perguntas!” – respondia Sandra, ainda muito bêbada – “Vem...não me fala nada!” - Sandra puxou Zé pelo braço. “Você está muito bem, pra um senhor de oitenta e dois anos sabia?” – disse a mulher, enquanto colocava a mão de Zé em seu corpo. “Chega!” – gritou o homem. “Vamos beber, depois dançamos, eu que mando aqui!” – completou, enquanto pegava a garrafa no canto do sofá.
“Saiu pra onde?!” – perguntava Negão para as meninas. “Ela tava triste porra, aonde ela ia se meter essa hora?” – continuava. “Vou atrás dela, eu to com umas paradas aí pra acertar com ela!” – Negão saiu do bordel. “Bom trabalho mulherada, se o Negão voltar, não digam nada, ninguém sabe de mim tão entendendo? Hoje quem vai acertar contas sou eu!” – disse Joana ao sair do quarto, onde estava escondida. “O que ta pegando Joana?” – perguntou Isa, umas das meninas. “Ta pegando não garota, vai pegar! Eu to com um lance engasgado há muito tempo, hoje eu limpo essa porra de mim, é hoje!” – respondeu a cafetina, enquanto escolhia uma roupa para sair.
Hélio estava com frio. O rapaz não queria sair do Sotão, Hélio procurou, entre as velharias que estavam lá guardadas, algo para se cobrir. Ele encontrou uma manta, provavelmente feita por Odete. Hélio voltou a chorar. Abraçado à manta, ficou observando as estrelas, entre as frestas do telhado.
“Então tá rolando festinha na casa do Zé-Bebum” – pensou Joana, enquanto ouvia de longe, as risadas de Sandra e Zé. “Eu vou acabar com a festinha dele!” – disse em voz baixa, enquanto conferia a arma na bolsa.
“Então você era músico?” – perguntou Sandra. “Eu nunca ia imaginar, ainda mais que você disse que não podia ouvir música!” – dizia e enrolava a língua a mulher. “É, eu toquei muito instrumento e cantei muito, a música era a minha vida, mas aí, nasceu meu filho e nunca mais ouvi nenhuma canção, nem toquei, nem cantei, nada!” – explicava o homem, enquanto mexia as cinzas no cinzeiro com o cigarro. “Mas O que aconteceu?” – perguntou Sandra. “Minha mulher era tudo pra mim, e eu fiquei feliz quando ela disse que ia nascer um filho nosso, fiquei feliz mesmo, mas aí, o menino nasceu surdo! Ah! Nunca vou esquecer aquela dor! A minha mulher na época se mostrou mais forte que eu, disse que a gente ia dar jeito, ia saber lidar. Eu vivia de música, você tem idéia do que senti? Meu único filho, surdo?” – continuava Zé. “Mas vocês não tiveram outros filhos?” – perguntou a mulher. “Lembra que eu te disse que minha mulher era estragada? Ts! Então, ficou oca depois que o surdinho nasceu, não podia ter outros filhos, e eu nem ia querer, se um veio surdo, o outro podia vir estragado também, não acha!?” – completou Zé. “Mas e seu filho? Você tem notícias dele?” – continuava interessada, Sandra. “Não, o moleque fugiu quando era criança ainda, uns nove, dez anos ele devia ter na época. Nunca mais eu soube nada. No dia que ele saiu, eu tava arrasado, tinha passado a noite em claro, era véspera de Natal. Quando finalmente consegui dormir e tava descansando, minha mulher me acordou aos berros, dizendo que ele tinha ido embora. Fiquei assustado, mas a culpa foi dela, aquela idiota! Nunca deixava o menino sair, eu dizia: Sofia, deixa o moleque sair, dar uma volta! Mas não, ela era teimosa, e deu no que deu, nunca mais soube dele, e ela ficou neurótica desde aquele dia... transformou minha vida num inferno, e até minutos antes de morrer, me culpou pelo desaparecimento do menino. Ela dizia que eu não tinha dado amor, que eu não tinha dado atenção.” – Zé parou de falar, com os olhos arregalados, olhando para o armário da sala, sem piscar. “Você nunca pensou em ir atrás dele?” – perguntou Sandra. Zé não respondeu. “Vamos mudar de assunto, quer mais um copinho?” – perguntou para Sandra. “Vou no banheiro, serve pra mim que eu já venho! Senhor músico!” – respondeu a mulher, rindo e bamba.
“Esse bosta! Vou acabar com ele!” – pensou Joana, que ouvia tudo, escondida nos fundos da casa de Zé. “É tudo culpa dele! Esse animal!” – continuava pensando – “Se não tivesse botado esse menino no mundo, se não tivesse deixado ele fugir, eu não tava passando por isso, mas eu não vou deixar assim, ele me paga!” – concluiu Joana. “Oi? Quem é você?” – perguntou Sandra ao acender a luz da lavanderia. Joana se assustou, e atirou.
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Nota: não existe previsão para a "Parte 10", por favor, respeitem a bagunça deste blog.

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